Amanhecer na fazenda

Acordo com cenas estranhas dançando em minha mente.

Fico alguns segundos decidindo se é real ou um sonho que acabara de ter.

É um sonho, constato. Mas onde estou?

Isso me acontece sempre, ao acordar em outro lugar que não seja minha casa.

Aquela sensação de não saber onde estou. Semelhante quando acordo numa segunda-feira, pensando que ainda é domingo.

(Alguns segundos e a realidade surge. nesse caso, decepcionante; porque convenhamos, acordar sabendo que é domingo é bem mais gratificante).



Estou na fazenda.



Os sons que chegam até meus ouvidos dão-me esta certeza.

Vacas leiteiras berrando, a espera de que seu leite seja tirado, para que possam enfim estar junto aos seus filhos.

Esse som que elas emitem , onde os agudos e graves se misturam às dezenas.

Parece uma sinfonia, com o ritmo repetitivo.

Vai continuar assim até que o retiro acabe.

Esse som eu não ouço mais lá no meu cantinho...

O dia está clareando. Não sei se durmo mais um pouco ou me levanto.

Fico a ouvir outros sons.

Agora do lado oposto, entrando pela janela.

Pássaros já cantam. Eles cantam sempre a mesma canção. Cada um a sua, por espécie. Isso eu sei.

Só não sei distingui-los por sua melodia.

Se meu marido estivesse aqui, me diria, ele conhece bem.

As maritacas, estou certa. Estão em bando.

Elas também vem lá no meu cantinho...

Ouço galinhas de angola... to fraco... to fraco...um som da minha infância...

Do meu cantinho também...

Uma rolinha ao longe...fogo apagou...fogo apagou...

Canarinhos, estou reconhecendo.

Aqui eles ainda não são raros. Não estão em gaiolas.

No meu meu cantinho eles aparecem raramente...

Agora, o mais interessante! Um som bem próximo a minha janela.

Estão aqui desde ontem à noite!

O mesmo som que me fez demorar a dormir, apesar de tão cansada pela viajem.

São eles, os gansos... estiveram rondando a casa a noite inteira.

Um barulho ensurdecedor...( esse som eu não sei como se chama).

São os guardiões do quintal.

Perceberam, sem que ninguém lhes avisasse, que tem gente diferente na casa.

Agora, tenho certeza, foram eles que me acordaram tão cedo!

Estão esperando que eu abra a janela, para me reconhecerem.

Eles não me viram ainda.

Ah, os gansos, esses eu conheço bem.

Eu os tenho lá no meu cantinho...

Abro a janela:

Bom dia!!!

Uma algazarra inexplicável!

Lá se foram, espalhando-se pelo quintal.

Tal qual no meu cantinho...